Acordo Brasil-Santa Sé
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos
Jurídicos
DECRETO Nº 7.107, DE 11 DE
FEVEREIRO DE 2010.
Promulga o Acordo entre o
Governo da República Federativa do Brasil e a Santa Sé relativo ao Estatuto
Jurídico da Igreja Católica no Brasil, firmado na Cidade do Vaticano, em 13 de
novembro de 2008.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no
uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e
Considerando que o Governo da
República Federativa do Brasil e a Santa Sé celebraram, na Cidade do Vaticano,
em 13 de novembro de 2008, um Acordo relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja
Católica no Brasil;
Considerando que o Congresso
Nacional aprovou esse Acordo por meio do Decreto Legislativo no 698, de 7 de
outubro de 2009;
Considerando que o Acordo
entrou em vigor internacional em 10 de dezembro de 2009, nos termos de seu
Artigo 20;
DECRETA:
Art. 1o O Acordo entre o Governo da República
Federativa do Brasil e a Santa Sé relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja
Católica no Brasil, firmado na Cidade do Vaticano, em 13 de novembro de 2008,
apenso por cópia ao presente Decreto, será executado e cumprido tão
inteiramente como nele se contém.
Art. 2o São sujeitos à aprovação do Congresso
Nacional quaisquer atos que possam resultar em revisão do referido Acordo,
assim como quaisquer ajustes complementares que, nos termos do art. 49, inciso
I, da Constituição, acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio
nacional.
Art. 3o Este Decreto entra em vigor na data de sua
publicação.
Brasília, 11 de fevereiro de
2010; 189º da Independência e 122º da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Celso Luiz Nunes Amorim
ACORDO ENTRE A REPÚBLICA
FEDERATIVA DO BRASIL E A SANTA SÉ
RELATIVO AO ESTATUTO JURÍDICO
DA IGREJA CATÓLICA NO BRASIL
A República Federativa do
Brasil
e
A Santa Sé
(doravante denominadas Altas
Partes Contratantes),
Considerando que a Santa Sé é
a suprema autoridade da Igreja Católica, regida pelo Direito Canônico;
Considerando as relações
históricas entre a Igreja Católica e o Brasil e suas respectivas
responsabilidades a serviço da sociedade e do bem integral da pessoa humana;
Afirmando que as Altas Partes
Contratantes são, cada uma na própria ordem, autônomas, independentes e
soberanas e cooperam para a construção de uma sociedade mais justa, pacífica e
fraterna;
Baseando-se, a Santa Sé, nos
documentos do Concílio Vaticano II e no Código de Direito Canônico, e a
República Federativa do Brasil, no seu ordenamento jurídico;
Reafirmando a adesão ao
princípio, internacionalmente reconhecido, de liberdade religiosa;
Reconhecendo que a
Constituição brasileira garante o livre exercício dos cultos religiosos;
Animados da intenção de
fortalecer e incentivar as mútuas relações já existentes;
Convieram no seguinte:
Artigo 1º
As Altas Partes Contratantes
continuarão a ser representadas, em suas relações diplomáticas, por um Núncio
Apostólico acreditado junto à República Federativa do Brasil e por um
Embaixador(a) do Brasil acreditado(a) junto à Santa Sé, com as imunidades e
garantias asseguradas pela Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, de
18 de abril de 1961, e demais regras internacionais.
Artigo 2º
A República Federativa do
Brasil, com fundamento no direito de liberdade religiosa, reconhece à Igreja
Católica o direito de desempenhar a sua missão apostólica, garantindo o
exercício público de suas atividades, observado o ordenamento jurídico brasileiro.
Artigo 3º
A República Federativa do
Brasil reafirma a personalidade jurídica da Igreja Católica e de todas as
Instituições Eclesiásticas que possuem tal personalidade em conformidade com o
direito canônico, desde que não contrarie o sistema constitucional e as leis
brasileiras, tais como Conferência Episcopal, Províncias Eclesiásticas,
Arquidioceses, Dioceses, Prelazias Territoriais ou Pessoais, Vicariatos e
Prefeituras Apostólicas, Administrações Apostólicas, Administrações Apostólicas
Pessoais, Missões Sui Iuris, Ordinariado Militar e Ordinariados para os Fiéis
de Outros Ritos, Paróquias, Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida
Apostólica.
§ 1º. A Igreja Católica pode
livremente criar, modificar ou extinguir todas as Instituições Eclesiásticas
mencionadas no caput deste artigo.
§ 2º. A personalidade jurídica
das Instituições Eclesiásticas será reconhecida pela República Federativa do
Brasil mediante a inscrição no respectivo registro do ato de criação, nos
termos da legislação brasileira, vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro do ato de criação,
devendo também ser averbadas todas as alterações por que passar o ato.
Artigo 4º
A Santa Sé declara que nenhuma
circunscrição eclesiástica do Brasil dependerá de Bispo cuja sede esteja fixada
em território estrangeiro.
Artigo 5º
As pessoas jurídicas
eclesiásticas, reconhecidas nos termos do Artigo 3º, que, além de fins
religiosos, persigam fins de assistência e solidariedade social, desenvolverão
a própria atividade e gozarão de todos os direitos, imunidades, isenções e
benefícios atribuídos às entidades com fins de natureza semelhante previstos no
ordenamento jurídico brasileiro, desde que observados os requisitos e
obrigações exigidos pela legislação brasileira.
Artigo 6º
As Altas Partes reconhecem que
o patrimônio histórico, artístico e cultural da Igreja Católica, assim como os
documentos custodiados nos seus arquivos e bibliotecas, constituem parte
relevante do patrimônio cultural brasileiro, e continuarão a cooperar para
salvaguardar, valorizar e promover a fruição dos bens, móveis e imóveis, de
propriedade da Igreja Católica ou de outras pessoas jurídicas eclesiásticas,
que sejam considerados pelo Brasil como parte de seu patrimônio cultural e
artístico.
§ 1º. A República Federativa
do Brasil, em atenção ao princípio da cooperação, reconhece que a finalidade
própria dos bens eclesiásticos mencionados no caput deste artigo deve ser
salvaguardada pelo ordenamento jurídico brasileiro, sem prejuízo de outras finalidades
que possam surgir da sua natureza cultural.
§ 2º. A Igreja Católica,
ciente do valor do seu patrimônio cultural, compromete-se a facilitar o acesso
a ele para todos os que o queiram conhecer e estudar, salvaguardadas as suas
finalidades religiosas e as exigências de sua proteção e da tutela dos
arquivos.
Artigo 7º
A República Federativa do
Brasil assegura, nos termos do seu ordenamento jurídico, as medidas necessárias
para garantir a proteção dos lugares de culto da Igreja Católica e de suas
liturgias, símbolos, imagens e objetos cultuais, contra toda forma de violação,
desrespeito e uso ilegítimo.
§ 1º. Nenhum edifício,
dependência ou objeto afeto ao culto católico, observada a função social da
propriedade e a legislação, pode ser demolido, ocupado, transportado, sujeito a
obras ou destinado pelo Estado e entidades públicas a outro fim, salvo por
necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, nos termos da
Constituição brasileira.
Artigo 8º
A Igreja Católica, em vista do
bem comum da sociedade brasileira, especialmente dos cidadãos mais
necessitados, compromete-se, observadas as exigências da lei, a dar assistência
espiritual aos fiéis internados em estabelecimentos de saúde, de assistência
social, de educação ou similar, ou detidos em estabelecimento prisional ou
similar, observadas as normas de cada estabelecimento, e que, por essa razão,
estejam impedidos de exercer em condições normais a prática religiosa e a
requeiram. A República Federativa do Brasil garante à Igreja Católica o direito
de exercer este serviço, inerente à sua própria missão.
Artigo 9º
O reconhecimento recíproco de
títulos e qualificações em nível de Graduação e Pós-Graduação estará sujeito,
respectivamente, às exigências dos ordenamentos jurídicos brasileiro e da Santa
Sé.
Artigo 10
A Igreja Católica, em atenção
ao princípio de cooperação com o Estado, continuará a colocar suas instituições
de ensino, em todos os níveis, a serviço da sociedade, em conformidade com seus
fins e com as exigências do ordenamento jurídico brasileiro.
§ 1º. A República Federativa
do Brasil reconhece à Igreja Católica o direito de constituir e administrar
Seminários e outros Institutos eclesiásticos de formação e cultura.
§ 2º. O reconhecimento dos
efeitos civis dos estudos, graus e títulos obtidos nos Seminários e Institutos
antes mencionados é regulado pelo ordenamento jurídico brasileiro, em condição
de paridade com estudos de idêntica natureza.
Artigo 11
A República Federativa do
Brasil, em observância ao direito de liberdade religiosa, da diversidade
cultural e da pluralidade confessional do País, respeita a importância do
ensino religioso em vista da formação integral da pessoa.
§1º. O ensino religioso,
católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui
disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental,
assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em
conformidade com a Constituição e as outras leis vigentes, sem qualquer forma
de discriminação.
Artigo 12
O casamento celebrado em
conformidade com as leis canônicas, que atender também às exigências
estabelecidas pelo direito brasileiro para contrair o casamento, produz os
efeitos civis, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a
partir da data de sua celebração.
§ 1º. A homologação das
sentenças eclesiásticas em matéria matrimonial, confirmadas pelo órgão de
controle superior da Santa Sé, será efetuada nos termos da legislação
brasileira sobre homologação de sentenças estrangeiras.
Artigo 13
É garantido o segredo do
ofício sacerdotal, especialmente o da confissão sacramental.
Artigo 14
A República Federativa do
Brasil declara o seu empenho na destinação de espaços a fins religiosos, que
deverão ser previstos nos instrumentos de planejamento urbano a serem
estabelecidos no respectivo Plano Diretor.
Artigo 15
Às pessoas jurídicas
eclesiásticas, assim como ao patrimônio, renda e serviços relacionados com as
suas finalidades essenciais, é reconhecida a garantia de imunidade tributária
referente aos impostos, em conformidade com a Constituição brasileira.
§ 1º. Para fins tributários,
as pessoas jurídicas da Igreja Católica que exerçam atividade social e
educacional sem finalidade lucrativa receberão o mesmo tratamento e benefícios
outorgados às entidades filantrópicas reconhecidas pelo ordenamento jurídico
brasileiro, inclusive, em termos de requisitos e obrigações exigidos para fins
de imunidade e isenção.
Artigo 16
Dado o caráter peculiar
religioso e beneficente da Igreja Católica e de suas instituições:
I -O vínculo entre os
ministros ordenados ou fiéis consagrados mediante votos e as Dioceses ou
Institutos Religiosos e equiparados é de caráter religioso e portanto,
observado o disposto na legislação trabalhista brasileira, não gera, por si
mesmo, vínculo empregatício, a não ser que seja provado o desvirtuamento da
instituição eclesiástica.
II -As tarefas de índole
apostólica, pastoral, litúrgica, catequética, assistencial, de promoção humana
e semelhantes poderão ser realizadas a título voluntário, observado o disposto
na legislação trabalhista brasileira.
Artigo 17
Os Bispos, no exercício de seu
ministério pastoral, poderão convidar sacerdotes, membros de institutos
religiosos e leigos, que não tenham nacionalidade brasileira, para servir no
território de suas dioceses, e pedir às autoridades brasileiras, em nome deles,
a concessão do visto para exercer atividade pastoral no Brasil.
§ 1º. Em conseqüência do
pedido formal do Bispo, de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, poderá
ser concedido o visto permanente ou temporário, conforme o caso, pelos motivos
acima expostos.
Artigo 18
O presente acordo poderá ser
complementado por ajustes concluídos entre as Altas Partes Contratantes.
§ 1º. Órgãos do Governo
brasileiro, no âmbito de suas respectivas competências e a Conferência Nacional
dos Bispos do Brasil, devidamente autorizada pela Santa Sé, poderão celebrar
convênio sobre matérias específicas, para implementação do presente Acordo.
Artigo 19
Quaisquer divergências na
aplicação ou interpretação do presente acordo serão resolvidas por negociações
diplomáticas diretas.
Artigo 20
O presente acordo entrará em
vigor na data da troca dos instrumentos de ratificação, ressalvadas as
situações jurídicas existentes e constituídas ao abrigo do Decreto nº 119-A, de
7 de janeiro de 1890 e do Acordo entre a República Federativa do Brasil e a
Santa Sé sobre Assistência Religiosa às Forças Armadas, de 23 de outubro de
1989.
Feito na Cidade do Vaticano,
aos 13 dias do mês de novembro do ano de 2008, em dois originais, nos idiomas
português e italiano, sendo ambos os textos igualmente autênticos.
PELA REPÚBLICA FEDERATIVA DO
BRASIL
Celso Amorim
Ministro das Relações
Exteriores
PELA SANTA SÉ
Dominique Mamberti
Secretário para Relações com
os Estados
Este texto não substitui o
publicado no DOU de 12.2.2010
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